Robô faz companhia para idosos devido à pandemia e ajudou a melhorar a saúde mental de 83 mil pessoas da terceira idade que vivem em casas de repouso no Brasil; e ainda conta charadas e toca músicas
Com o passar dos anos é normal que o corpo não acompanhe mais a mente humana como era na juventude. Os sinais da idade aparecem, fios brancos, porém, algumas lembranças podem ser perder neste processo de envelhecimento. E ainda podem vir junto de uma profunda solidão no caso de idosos que vem em isolamento em casas de repouso, sem o carinho e atenção de suas famílias, por conta da distância. Tudo isso, a longo prazo, pode provocar danos físicos e psicológicos. A saúde mental deve se estender a todas faixas etárias.
Robô faz companhia para idosos
Sendo assim, estudantes do SESI (Serviço Social da Indústria) de Santa Bárbara d’Oeste (SP), criaram um robô que faz companhia para idosos. Chamado de Companhia (CIA) Virtual, o robô é capaz de contar charadas, tocar músicas e interagir sonoramente.
Além disso, a criação de Henrique Ailer, Leonardo Zanetti e Ryan dos Santos, 15 anos tem o objetivo de melhorar a saúde mental daqueles que vivem em instituições de longa permanência para pessoas idosas.
De acordo com o estudante Henrique Ailer:
“O robô procura simular uma companhia humana ao idoso que está se sentindo solitário, de uma maneira virtual. Dessa maneira, tendo o robô para interagir, o idoso acaba se sentindo mais tranquilo e querido, ele sente como se tivesse alguém lá junto com ele.”
1º lugar no Febrace
Todavia, o experimento dos estudantes do SESI conquistou o primeiro lugar em engenharia da Feira Paulista de Ciência e Tecnologia e foi indicado à Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace).
Segundo a orientadora do projeto, Érica Fátima:
“O robô colabora para o desenvolvimento cerebral, para que se estabeleça sinapses, estimula o diálogo, faz com que eles saiam do ambiente em que estão, se levantem da cama para comer, porque até isso, às vezes, era complicado lá.”
Companhia para a melhor idade
Conforme dados divulgados em 2020 pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), dos 210 milhões de brasileiros, 37,7 milhões são pessoas idosas, o que equivale a 17,9% da população. Porém, um estudo feito em 2011, pelo Instituto de Pesquisa Econômica (IPEA), indica que no Brasil 83 mil idosos vivem em instituições públicas ou privadas.
E com a pandemia, as medidas sanitárias nas casas de repouso ficaram ainda mais restritivas. Em alguns locais, as visitas passaram a ser apenas virtuais, como no Asilo São Vicente de Paulo (SP).
Diante deste cenário, a ideia dos estudantes do SESI se fez mais necessárias. Eles pensaram nas consequências na mente humana destes idosos afastados de seus familiares por um longo período de tempo.
Estudo da Universidade de Chicago
Segundo um estudo da Universidade de Chicago (EUA), os idosos que se consideram solitários apresentam até 14% mais chances de sofrer morte prematura. Além de influenciar no desenvolvimento de transtornos psicológicos, a solidão eleva a produção de hormônios de estresse e tensão. E isso colabora para inflamações em várias partes do corpo.
Como surgiu o robô CIA Virtual
Os alunos contataram a equipe do asilo para saber como eles estavam se sentindo realmente. Foi assim que nasceu o CIA Virtual, um protótipo de robô, com quase um metro de altura, que interage com os idosos conforme programações. Sobre isso, Érica explica:
“Nós sabemos que o virtual não substitui o contato humano, mas é algo diferente para atrair esses idosos, pra ver se leva um pouco de alegria a eles.”
Na sequência, eles criaram a modelagem tridimensional e imprimiram por meio de uma impressa 3D, o robô em MDF. Neste momento, eles usam a Alexa, uma assistente virtual, para a programação. Mas, pretendem trocar por arduíno, que é uma plataforma de prototipagem a qual controla sistemas interativos. O CIA Virtual também possui painéis com luzes de LED para imitar a ação dos olhos humanos, explica Henrique.
“Escolhemos a alexa por conta da similaridade com a voz humana, mas pretendemos trocar por um arduíno, equipado com as funções que ela tem, porém específico para o projeto.”
Música para os velhinhos
O CIA Virtual, desde sua implementação, aliou a música clássica em todas as refeições do asilo. O estudante Ryan dos Santos explica que eles programam canções para esses momentos. Mas, os idosos também podem pedir ao robô o que mais gostam de ouvir.
A playlist gira em torno de MPB, samba e sertanejo. No entanto, é a música “Dançarina”, dos cantores Pedro Sampaio e MC Pedrinho, que está entre as favoritas do repertório.
Além disso, a música tem o poder de liberar endorfina no corpo, aquela substância que aumenta a sensação de felicidade, prazer e bem-estar. Nas pessoas da terceira idade, que vivem em casas de repouso, essas sensações acabam ficando esquecidas muitas vezes.
Todavia, recordar bons momentos é sempre bom em qualquer idade. Mas para eles, sentir a nostalgia de uma música que marcou sua vida em um momento, é mais prazeroso ainda. É ter a chance de reviver tudo isso de novo e, consequentemente, é quando eles conseguem ativar a memória.
Solidão
A psicóloga especialista em saúde mental, Marina Antonucci, ressalta que a pandemia evidenciou a potência dos contatos virtuais.
“Os baixos níveis de contatos sociais podem associar-se a uma menor qualidade de vida, percebemos isso com a pandemia. A presença de uma rede de apoio com interações saudáveis é fator de proteção para diversos tipos de adoecimentos psíquicos.”
Ela ainda diz que experenciamos a solidão emocional quando há falta de um relacionamento íntimo. Entretanto, a especialista destaca que as causas e os efeitos podem ser diversos, desde questões sociodemográficas a traumas pessoais.
Por fim, ela fala que “a interação é fator protetivo, desde que este aspecto qualitativo seja levado em consideração, ou seja, desde que a pessoa idosa sinta-se considerada, cuidada e pertencente”.
*Foto: Reprodução